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É muito pior do que parece – o novo ministro e os velhos hábitos

Humberto Dantas Fica fácil olhar para a nomeação de Fábio Faria para o recriado Ministério das Comunicações – que em outros governos já foi do dono do partido que acolhe o jovem deputado, Gilberto Kassab – e apontar apenas que ele é genro de Silvio Santos e tem em seu currículo um rol considerável de figuras do mundo pop na lista de ex-namoradas – Galisteu, Sabrina Sato etc. O rapaz, chamado pelas “carinhosas” listas de propina da Odebrecht de Bonitão ou Garanhão, e que faz campanha eleitoral explorando sua beleza em cidades do Rio Grande do Norte, é muito mais “interessante” de ser observado do que a partir do seu sex appeal. Para começar, Fábio seria a antítese do que muitos gostam de chamar de bolsonarismo. Mas deve ser símbolo de uma flexibilidade nascida depois que o presidente percebeu que já deu motivos de sobras para o Congresso colocar ponto final em seu governo. Assim, sob os elogios de Rodrigo Maia, o Botafogo, Bolsonaro resolveu se render a tudo o que ele mesmo combatia até outro dia e chamou o Bonitão. Para além de ceder cargos em excesso e liberar emendas a rodo, o “Mito” emprega a partir de agora claramente um membro do baixo clero do Legislativo que habita aquele centrão repleto de fotos com Lula, Dilma e companhia limitada. Nada contra tais movimentos, quem tinha a reclamar era o presidente e o seu eleitorado mais fiel. O astrólogo da Virgínia, por exemplo, deve estar vibrando, e com ele a prole real que ama dizer por meio de Carlos que a comunicação do governo é trágica. Agora vai melhorar?

Depende da emissora que você, leitor, assiste. O SBT vai ajudar, mas isso faz parte de sua marca registrada na história da televisão brasileira. Quem tem mais de 30 anos se lembra do quadro “Semana do Presidente”, transmitido dos anos 80 até início dos 2000 durante o Show de Calouros, narrando em tom de devoção os afazeres de Figueiredo, Sarney, Collor, Itamar e FHC, por exemplo. A emissora é tão chapa branca que cogitou voltar com o quadro para agraciar Bolsonaro e a sede de equilíbrio de pauta do general Mourão, sendo que hoje é Ratinho quem serve para receber aqueles personagens envolvidos nos interesses estratégicos de seu patrão. Lembremos que no dia em que o vídeo da patética reunião ministerial foi liberado pelo STF o jornal da emissora foi retirado do ar. E viva o jornalismo e a liberdade de patronagem. Mas não fique apenas nisso. Tá fácil demais. Fábio, casado com Patrícia Abravanel, está em quarto mandato como deputado federal num estado em que é dificílimo conquistar uma das oito vagas para a Câmara – ele ficou com a última em 2018. Raramente quem não é dono de emissora de rádio ou TV entra, e a concentração de votos nos primeiros colocados chega a assombrar. Pesquisas e mais pesquisas tratam de indicar o quanto os proprietários das antenas mandam no Rio Grande do Norte, com raras exceções. O debilitado estado é fruto de hordas de expropriadores que insistem em aparecer nos piores escândalos de corrupção do país. Com os Faria não seria diferente.

Robinson, pai do novo ministro e o “Bonitinho” da já citada lista da empreiteira, presidiu a Assembleia Legislativa de 2003 a 2010. Isso mesmo que você está lendo e eu retirei do portal oficial da casa: oito anos de mandato dominando o parlamento. Mas isso é legal. Deve mesmo ser mesmo. Ilegal é o seu envolvimento como maior beneficiário na Operação Dama de Espadas, escândalo de servidores fantasmas detalhado pela premiada delação de Ritinha, ex-assessora, que apontou que Robinson recebia mesada de R$ 100 mil desviados dos cofres públicos potiguares. Um terreno de R$ 30 milhões está na lista retenções que a justiça ordenou para arrefecer os danos, e o apartamento que ele mora, deslumbrante, pode ajudar um dia. Que bonitinho! O rei de espadas desse baralho parece que está fácil de ser notado. E o valete?

Tamanho poder levou o pai do galã, extremamente vaidoso e convicto – características que notei quando o entrevistei para um livro faz cerca de uma década – ao cargo de vice-governador na chapa da pessimamente avaliada Rosalba Ciarlini em 2010 e, depois de romper com ela durante o mandato, ao governo do estado em 2014. Aqui teve o apoio absoluto de Lula e Dilma contra o ex-presidente da Câmara e ex-ministro do Turismo Henrique Eduardo Alves (MDB), que depois de alguns meses atrás das grades aguarda julgamento associado à Operação Lava-Jato em liberdade.

Comandar o estado era o sonho de Robinson Faria, e o mandato foi tão bom e reconhecido que em 2018, no instante de se reeleger, ele teve menos de 12% dos votos no primeiro turno, de posse da máquina estadual venceu o pleito em apenas cinco cidades e viu o vitorioso PT e o derrotado PDT disputarem o segundo turno. Assim, o PT agora é inimigo, pois venceu a família. Fábio deve sonhar com o cargo que foi do pai, e vai ver foi isso que alegrou o presidente.

Ao contrário do que Bolsonaro diz, que Fábio nada entende de comunicação, esse ponto deve ser revisto. A família é detentora de concessões de rádio no estado, e o pai tinha um programa daqueles de conversar ao pé do ouvido com o povo carente do agreste nas tardes de domingo. Quais interesses o ministro atenderá? Lembrando que a pasta que o presidente afirma que pouco custará para o país controla toda a estratégia de comunicação do governo, distribui os quase meio bilhão de reais de publicidade, é responsável por empresas públicas, trabalha com a lógica de concessões e nos anos 80 foi utilizada por Antônio Carlos Magalhães, ministro de José Sarney, para cooptar parlamentares e criar o que hoje conhecemos como Centrão durante o processo constituinte. Simples assim. Difícil mesmo vai ser lidar com Carlos, que até na conta publicitária do Banco do Brasil dá as cartas.

Pois bem, não paremos por aqui e não olhemos para o futuro, pois o passado tem muito a nos contar. De acordo com matéria de O Globo de 2019, no âmbito da Lava-Jato, “em sua delação, Ricardo Saud afirmou que a J&F (irmãos Batista) repassou R$ 10 milhões a Fábio e Robinson Faria em troca da privatização da Companhia de Água e Esgoto do governo do RN, mas que a contrapartida não ocorreu porque a empresa perdeu interesse em realizar investimentos nessa área”. Como esse tipo de operação era o orgulho de Sérgio Moro, pode ser que Bolsonaro flexibilize por vingança. Mas outras histórias desse tipo não faltam, e aqui deixamos a última. De acordo com o portal G1, em 2017, “Robinson Mesquita de Faria é investigado junto com a prefeita de Mossoró (RN), Rosalba Ciarlini Rosado (PP), e o deputado federal Fábio Faria (PSD) devido às delações de Alexandre José Lopes Barradas, Fernando Luiz Ayres da Cunha Reis, Benedicto Barbosa da Silva Júnior, Ariel Parente e João Antônio Pacífico Ferreira. Segundo o Ministério Público, a Odebrecht Ambiental desejava desenvolver PPP’s (Parcerias Público-Privadas) de saneamento básico no estado e, por isso, a Odebrecht doou R$ 350 mil ao governador Robinson Faria e à prefeita Rosalba Ciarlini, e R$ 100 mil ao deputado Fábio Faria na campanha de 2010 “para eventual favorecimento em projetos relacionados a saneamento básico””.

Notou algo estranho nas fontes utilizadas? Sim. São do grupo Globo, o que para Bolsonaro pode ser “perseguição regressiva”. Assim, que venha o novo ministro, no novo ministério, do novo jeito de Bolsonaro governar.

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