Eduardo Seino
Quando falamos de mudanças de regras do sistema político, para a população em geral, trata-se de um mundo paralelo, ininteligível, no qual imperam a corrupção, o corporativismo e, por isso, indigno de atenção. Ledo engano. Já no debate entre as partes interessadas, sobretudo atores políticos e analistas, é muito comum observarmos, por parte dos mais envolvidos nas discussões, apostas altas e discursos acalorados que exclamam: “isso será ótimo e aquilo será uma tragédia!”.
As estratégias de previsibilidade sempre sujeitam os apostadores, ainda que bem fundamentados, a quebrarem a cara. O elemento dificultador quase sempre está relacionado à incrível capacidade criativa dos jogadores de se adaptarem às novas regras em proveito próprio. Nesse sentido, as alterações das regras eleitorais recentemente aprovadas – nossa bola da vez – levantam muito mais questionamentos do que certezas.
Por exemplo, na prática, a federação partidária deve servir somente aos mesmos propósitos das coligações proporcionais, isto é, oferecer maior chance de sobrevivência aos partidos políticos menores? Se sim, trazer a federação partidária ao baile foi nada mais do que dourar a pílula? Ou podemos acreditar que, por ser mais duradoura do que a coligação, a federação partidária promoverá uma maior coerência ideológica, inclusive devido ao seu prolongamento nos demais níveis federativos?
Aqui cabe um parênteses. Quando representantes de alguns partidos menores, interessados nas coligações ou nas federações, afirmam que “foi uma vitória da democracia”, está pressuposta uma narrativa em que quanto maior a pluralidade, maior a qualidade da democracia. O discurso é potente, porque trabalha com um valor essencial para regimes democráticos (o pluralismo), porém de forma distorcida.
Há um bom tempo o pluralismo partidário não é uma demanda urgente da democracia brasileira. Antes o contrário, uma vez que o excesso de partidos políticos dentro das casas legislativas tem se apresentado como empecilho da formação de coalizões e tomada decisória. Assim, o problema operacional da democracia brasileira, nos últimos tempos, não é de pluralidade partidária, mas de representatividade societária dentro dos partidos políticos e dos poderes constituídos. Neste ponto há uma novidade que mistura esperança e ceticismo.
Qual será o impacto de contabilizar em dobro os votos de mulheres e negros candidatos à Câmara dos Deputados para fins de distribuição do fundo partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC)? Nesta questão, mais do que tentar prever, esperamos profundamente que este incentivo institucional indireto se transforme em ampliação da representação destes grupos no Legislativo.
Por fim, se um dos argumentos favoráveis à federação partidária é um suposto estímulo à coerência ideológica e fidelidade partidária, ou seja, mecanismos de fortalecimentos dos partidos, qual o sentido de criar mais uma facilidade para o representante eleito migrar de partido? E, em alguns casos, qual será o preço da “anuência do partido” para a migração?
Créditos da imagem: Marcelo Cassal Jr. / Agência Brasil
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