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A hora e a vez dos partidos

Bruno Silva



Os cidadãos brasileiros não confiam nos partidos políticos! Cá entre nós, isso nem sequer é uma novidade, afinal, o descrédito dessas organizações políticas centrais em qualquer democracia ao redor do mundo é uma constante aqui e alhures. No Brasil, a desconfiança nos partidos há quase uma década estava na casa dos 50%. Hoje, já atinge 61% conforme a última pesquisa divulgada pelo DataFolha[1] feita entre os dias 13 e 15 de setembro. Pior, a desconfiança não é exclusiva em relação aos partidos, mas dirige-se a todas as instituições que guardam relação com a lógica democrática: Congresso Nacional, Presidência da República, Sindicatos, etc. No entanto, dentre todas, os partidos vencem com folga.



O grande paradoxo com o qual precisamos lidar no regime democrático envolvendo os partidos é esse: se as organizações responsáveis por promover a representação política não são dignas de confiança da maioria dos representados, como o cidadão pode esperar que as decisões originárias das lideranças dessas siglas possam levar em conta a preservação dos interesses públicos de quem dizem representar? Difícil imaginar. Aliás, muitos por aí certamente dirão que os políticos representam os seus próprios interesses e nada mais. Sejamos realistas, se há muita desconfiança deve haver boas razões para isso, afinal, nenhum eleitor é ingênuo.



Poder-se-ia até argumentar sobre assimetrias informacionais importantes a serem consideradas que impactam na percepção de cada um sobre os partidos, contribuindo para a disseminação de uma visão mais negativa acerca do papel que desempenham na democracia. Mas como a confiança é um fator difícil até de ser mensurado, pois está no plano subjetivo associado à segurança que algo ou alguém nos transmite, a reversão desse quadro generalizado de desconfiança é muito difícil e complexa. O caminho passaria por resultados políticos mais positivos resultantes da atuação dos partidos, intensificação da participação política nas agremiações, maior transparência em relação aos gastos das siglas, qualificação da política e expansão da compreensão popular sobre os difíceis papeis a serem cumpridos pelos partidos, como: representar as ideias e visões de mundo de diferentes setores da sociedade, recrutar cidadãos com capacidade de disputa eleitoral, conduzir os complicados trabalhos legislativos, formar governos em uma lógica de coalizão em meio à grande fragmentação partidária, dentre outros. Para ilustrar o quanto este desafio de minimização da desconfiança está distante, basta observar duas situações atuais envolvendo alguns partidos no Brasil.



Uma delas diz respeito ao fato de que nem o próprio presidente, cujo cargo é o mais importante do sistema político, está ligado a um partido político. Durante a maioria do seu mandato não esteve filiado a nenhuma dentre as trinta e três legendas registradas no TSE. Venceu as eleições em 2018 vinculado ao PSL, contribuiu para levar o partido da inexpressividade à segunda maior bancada na Câmara dos Deputados e, após um relacionamento turbulento com os dirigentes da sigla, foi em busca de criar um partido para “chamar de seu” (o que não conseguiu tirar do papel, diga-se de passagem). Desde então, o presidente busca um partido para registrar o seu nome e disputar as eleições do ano que vem, cujo prazo de filiação precisa ser de ao menos seis meses antes do pleito. Vários já se mostraram dispostos a recebê-lo ou já aventaram a possibilidade: PATRIOTA, PMB, PP, PL, REPUBLICANOS e, a negociação que parece mais adiantada no momento, sua ida para o PTB, envolve a possibilidade de nomeação de seus correligionários na Executiva Nacional do partido e escolha de candidatos ao Senado em estados vistos como estratégicos pelo presidente. Em suma, as negociações parecem aqueles leilões de quinquilharias a fim de se chegar a alguém que arremate o item leiloado. Em suma: excessivo pragmatismo de dirigentes partidários com o olhar direcionado apenas a surfar na onda do presidente, nenhum interesse republicano envolvido, muita desconfiança no ar a respeito de todos os atores envolvidos na negociata. Como o cidadão vai confiar que existe alguma preocupação com ele e os seus interesses representativos?




Outra situação que ganhou atenção nos meios de comunicação são as negociações que envolvem a possível fusão de PSL e DEM. Aos quatro ventos, o presidente nacional do DEM, ACM Neto, divulga a força que a nova sigla viria a ter nesse momento: formaria a maior bancada na Câmara dos Deputados (correspondente a um Senado inteiro com 81 parlamentares) podendo vir a ter candidato próprio à presidência (o que não parece nem um pouco crível diante dessa polarização da sociedade e a rejeição por uma terceira via), além de acessar um Fundo Partidário de cerca de 160 milhões de reais. Sem contar os recursos a serem obtidos no próximo ano em razão da utilização do Fundo Especial de Financiamento de Campanhas, também milionários. No entanto, há resistências das mais diversas à efetivação da fusão, derivadas das dificuldades de negociações em alguns estados, das disputas pelo controle regional do partido nascente (em São Paulo já há queda de braço pela presidência do partido que ainda nem se formou) e da eventual montagem de palanques para as eleições estaduais no ano que vem. Em alguns estados o racha já é facilmente visível, como é o caso do Rio de Janeiro, terra do desafeto de ACM, o ex-presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia. Novamente cabe a pergunta: como o cidadão vai confiar que existe alguma preocupação com ele e os seus interesses políticos?




Em outras palavras, todas as vezes que os partidos ganham as atenções é sempre para revelar embates e disputas internas que promovem rearranjos mirando as próximas eleições, para abocanhar fatias mais generosas de recursos públicos ou para alinhar os astros e órbitas dos dirigentes que almejam cargos, controle sobre recursos estatais ou políticas públicas. Não que os partidos sejam apenas isto, pois não são e, tampouco, a busca desses objetivos é necessariamente ruim. A grande questão é a dificuldade, em paralelo a tudo isso, de aparecer uma agenda positiva voltada à ampliação da participação da sociedade nas legendas, a promoção de debates e reuniões internas para a reestruturação dos partidos voltada à maior proximidade para com os liderados e o estímulo (real) à formação de novas lideranças mais preparadas ao exercício da política. É chegada, novamente, a hora e a vez dos partidos com a proximidade das eleições de 2022 e a pergunta que não quer calar é: dá para confiar que teremos partidos melhores nos próximos governos e nos próximos parlamentos? A resposta depende, por um lado, dos dirigentes e lideranças partidárias. Por outro lado, depende de mim e de você.

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