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As mudanças têm que ser dentro da democracia

Bruno Souza da Silva


Na noite da última terça-feira, caminhava para a finalização de mais uma aula na universidade. Alguns olharam para as telas dos smartphones: quase dez e meia. Percebo nitidamente que a turma está cansada, olhos caídos, a maioria lutando para se manter concentrado. Pauta do dia: identificarmos as principais contribuições teóricas de cientistas sociais que figuram na galeria da chamada “Teoria das Elites” – abordagem teórica voltada a compreender como se formam, recrutam, selecionam e atuam os membros das elites na sociedade (na aula em questão, especificamente os membros das elites políticas). Eis que um aluno levanta a mão e dirige a seguinte pergunta, já nos acréscimos: “Professor! Posto então que a teoria concebe que sempre há uma minoria que lidera e uma maioria que é liderada, mesmo dentro de um regime democrático [baseado em um ideal de igualdade entre os indivíduos], como aproximar líderes e liderados, se os líderes, por vezes, parecem estar tão distantes de nós?”.


A resposta a essa pergunta certamente não é simples. Aliás, pelo menos desde 2013 para cá, com a onda do “não me representa” e do “sem partido”, ao que tudo indica é que parcela expressiva da sociedade compreende a importância da política, mas questiona a sua eficiência representativa. Alguns chegaram até mesmo a cravar o fim da democracia representativa. No entanto, em larga medida, todos os mecanismos de inovação democrática das últimas décadas, no sentido da participação política, foram pensados e implantados a fim de diminuir essa distância entre nós e os políticos. Mais do que isso: são voltadas para conferir legitimidade às decisões, tornar mais porosas as instituições às demandas dos cidadãos e organizações da sociedade civil e, no limite, potencializar os mecanismos de accountability vertical. Mas não é só isso.


Por convicção, digo e repito: é preciso nos educar para a vida democrática. Em outras termos, não adianta apenas termos possibilidades de nos aproximarmos dos representantes. É preciso compreendermos como podemos participar e o quanto temos a perder quando não participamos, uma vez que outros, melhor organizados, certamente participarão e poderão levar adiante suas demandas de maneira mais eficiente.


Cada vez mais a realidade nos mostra o quanto é necessário olharmos com mais clareza para a qualidade das decisões dos nossos representantes, especialmente para os do Legislativo, terreno ainda ignorado por muitos, porém que se mostra central ao identificarmos que nenhum níquel sequer do financiamento das políticas públicas escapa à sua deliberação.


Para ilustrar essa necessidade, não são poucos os que acreditam, por exemplo, que o vereador – representante do Legislativo mais próximo da população – pertence ao Poder Executivo (quando não o considera funcionário do prefeito). Contudo, ainda bem que existem muitas organizações e até mesmo empresas incentivando a qualificação dos cidadãos, mesmo com a relativa distância das eleições municipais do próximo ano. É o caso da Engeform, empresa que atua nos ramos de engenharia, desenvolvimento imobiliário e energia, a qual vem abraçando a formação política como diferencial para os seus colaboradores.


Em uma das últimas aulas proferidas na empresa, junto com o colega de Legis-Ativo, Humberto Dantas, foi feito um desafio para todos os presentes: olharmos para a realidade, especialmente nas nossas cidades, e identificarmos um problema que nos incomoda. A partir daí, a ideia foi buscarmos informações acerca desse problema, no sentido de: há alguém ou alguma organização fazendo algo para tentar chamar a atenção sobre o problema? Algum representante já o abordou? Perceba: fazer esses questionamentos básicos implica, por vezes, não fazermos absolutamente nada, mas buscar o que já existe para identificar o que já foi feito e o que realmente ainda está por se fazer. Ao contrário do que o senso comum informa, tem muita gente fazendo diversas coisas por aí, e nem sabemos disso.


Temos sido pressionados, dia a dia, a nos posicionarmos, sermos convictos ideologicamente, escolhermos um lado sobre diversos temas, dos comportamentais aos econômicos. Em meio a toda essa pressão, deixamos de lado o mais importante: pensarmos e dialogarmos uns com os outros, sobretudo com os opostos. A qualificação para compreender o funcionamento da coisa pública, os limites da ação dos atores políticos e as possibilidades de transformação nos engradece na condição de cidadãos. Esta postura é que pode contribuir para nos aproximarmos e definirmos estratégias de ação, em grupo, organizados e fortalecidos. Ao contrário do que um certo vereador acredita, as mudanças têm que ocorrer dentro do terreno democrático, pois é somente por conta dele que temos direito a pensar livremente, agir associativamente e conviver pluralmente. Fora disso – e respondendo ao questionamento inicial do meu aluno – nem sequer há distância entre líderes e liderados, pois só há mandões autoritários.


Palavras-chave: Movimento Voto Consciente; Poder Legislativo; Democracia; Participação política; Eleições municipais.


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