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Como podemos garantir a participação das mulheres no Legislativo?

Hannah Maruci Aflalo

O incentivo à participação política feminina por meio de mudanças nas leis eleitorais no Brasil historicamente enfrentou uma alta resistência por parte dos partidos políticos. O sistema eleitoral brasileiro possui, desde a primeira lei que estabeleceu cotas de candidatura para um dos sexos, em 1995, iniciativas legislativas que atuam sobre esse problema. No entanto, como aponta a pesquisa da Fundação Getulio Vargas, os partidos políticos só começaram a cumprir os percentuais estipulados a partir das eleições de 2014, isto é, quase vinte anos depois.


Inicialmente, o argumento utilizado pelos líderes partidários era de que a lei previa a reserva dos lugares para mulheres, mas que essas não demonstravam interesse em se candidatar e, portanto, as vagas eram ocupadas por homens. A lei de 1997, para evitar qualquer mal entendido na interpretação da lei, determinou que 30% das candidaturas para todas as eleições proporcionais deveriam ser preenchidas por um dos gêneros. Ainda assim, foi apenas após uma decisão de 2012 do STF, que determinou que os partidos que não apresentassem o mínimo de cotas estabelecido pela lei deveriam diminuir a quantidade de candidaturas do outro gênero (masculinas), que o percentual começou a ser efetivamente cumprido.


Porém, essa proporção ainda não se reflete na quantidade de mulheres eleitas. Nas últimas eleições, consideradas positivas por conta do aumento de mulheres eleitas, o percentual de deputadas no Congresso Nacional foi de apenas 15%, sendo dessas pouco mais de 2% mulheres negras. Os motivos desse resultado vão desde a reprodução eleitoral de uma desigualdade estrutural existente na sociedade brasileira em relação a gênero e raça, até a proliferação das chamadas candidaturas laranjas – candidaturas que existem apenas para preencher a lista, mas que nunca se converterão em cadeiras.


A importância e o efeito da legislação eleitoral para aumentar a participação de mulheres já foi discutida neste blog quando tratamos da reserva dos 30% dos recursos eleitorais para campanhas femininas ou quando atentamos para o não cumprimento dessas regraspelos partidos. Diante deste cenário, como podemos propor mudanças legislativas que alterem efetivamente a situação de desigualdade existente hoje em nosso sistema político? O Movimento Mais Mulheres na Política busca criar alternativas e respostas à essa pergunta. Trata-se de uma iniciativa suprapartidária organizada pelo Ministério Público de São Paulo, em parceria com juristas, cientistas políticas e organizações da sociedade civil que propõem ações para alterar essa realidade. Assim, foram lançados em 2019 projetos de lei que buscam a inserção efetiva das mulheres na política institucional.


O primeiro deles amplia e intensifica a lei de cotas já existente no sistema eleitoral brasileiro. A inovação é que, além de exigir um percentual mais alto do que o existente – 50%  de mulheres -, esse percentual diz respeito à reserva de cadeiras, não apenas à proporção de candidaturas lançadas na lista do partido ou coligação. Isso significa que, com a aprovação de PL, necessariamente metade do Parlamento passaria a ser ocupado por mulheres. Outra novidade é a reivindicação de que dos 50% reservados às mulheres, 25% deverá ser exclusivo para mulheres negras. Para justificar essa escolha, o movimento se baseia nos dados de financiamento apresentados nesse blog, que mostram como as mulheres negras são o grupo mais sub representado e sub financiado na política brasileira.


O segundo projeto de lei apresentado pelo movimento vai no sentido de incentivar os partidos a investirem em candidaturas femininas. Para isso, o PL propõe que a distribuição dos recursos público do Fundo Eleitoral de Financiamento de Campanha (FEFC), que atualmente tem como um dos critérios a quantidade de deputados eleitos pelo partido nas eleições anteriores, conceda peso dois às deputadas eleitas. Na prática, isto significa que, quanto mais deputadas o partido eleger em uma eleição, mais dinheiro irá receber proporcionalmente nas eleições seguintes. Espera-se, portanto, com a aprovação dessa lei, que os partidos passem a ter interesse em promover as candidaturas de mulheres.


Esses projetos deverão ser apresentados pela via da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher da Câmara dos Deputados (o projeto que versa sobre o financiamento) e como projeto de iniciativa popular (o que institui a reserva de cadeiras). Para realizar a promoção dos projetos e a coleta de assinaturas, o movimento conta hoje com 720 lideranças comprometidas em 26 estados de todo o Brasil, tem 1300 mulheres mobilizadas em 14 grupos de trabalho no WhatsApp e mais de 2000 pessoas mobilizadas pelas redes sociais. O objetivo é não apenas aumentar a quantidade de mulheres na política, mas garantir uma igualdade no que diz respeito à gênero e raça. Tal equidade só poderá ser alcançada quando o Congresso refletir de maneira justa os grupos que compõem a população brasileira.



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