Araré Carvalho
Com dizia o poeta Charles Bukowski, “A raça humana exagera em tudo: seus heróis, seus inimigos, sua importância.” Ao final das apurações dos votos, simpatizantes da esquerda e da direita tentavam digerir e entender o resultado das urnas. Como é normal, num primeiro momento o sentimento aflora e a racionalidade perde espaço. Vemos os eleitores mais engajados, políticos e até analistas políticos passarem por todas as fases do luto num espaço de 24 horas. Vão do primeiro estágio: negação e isolamento, passando pela raiva, barganha, depressão até o quinto e último estágio que é a aceitação.
Passado esse período mais crítico, ambos os lados começaram a relativizar as “derrotas”. Se por um lado o bolsonarismo elegeu muitos senadores e deputados, ficaram decepcionados com o segundo lugar do capitão. Se os institutos de pesquisa erraram na porcentagem de votos válidos de Bolsonaro, o “datapovo” também errou. Pessoas de dentro da campanha do atual presidente relatam que ele ficou decepcionado com o resultado.
Pelo lado da esquerda, a campanha pelo voto útil, deflagrada nas últimas semanas, não surtiu o efeito esperado. Aliás, descobriram que a direita também pode optar pelo voto útil. A vitória do PL nas eleições para a Câmara dos Deputados e de aliados do presidente para as cadeiras do Senado, acabou gerando na campanha do ex-presidente Lula uma “vitória com gosto de derrota”.
Passado esse momento inicial, é hora de as campanhas realinharem os discursos, estabelecerem alianças e tentarem convencer indecisos e eleitores dos candidatos que não passaram para o segundo turno. O bolsonarismo, após fazer das urnas o bode expiatório no primeiro turno, deve focar as críticas nos institutos de pesquisa. A urna deve ser deixa de lado, uma vez que questioná-la seria questionar a votação massiva que seus candidatos obtiveram.
Já o lulismo, superado o pessimismo da militância, deverá fazer claro sinais ao centro. Provavelmente deve anunciar o ministro da fazenda, com um forte aceno ao mercado. Meirelles vem aí?!
No segundo turno de 2018 tivemos menos eleitores do que no primeiro turno. Foram cerca de 118 milhões de votos válidos no 1° turno, contra 116 milhões, no 2° turno. Se esses números se repetirem, o candidato precisará de pouco mais de 58 milhões de votos para vencer. Lula obteve pouco mais de 57 milhões neste 1° turno. Claro que esse cenário é se levarmos em conta que o número de brancos, nulos e de ausentes se manterá.
De qualquer forma, o segundo turno vai ser tudo, menos monótono. Primeiro porque ele terá uma semana a mais que os anteriores, elevando o cansaço e desgaste das campanhas. Segundo porque os debates agora são confrontos diretos. Bolsonaro tem a máquina do Estado a seu favor e parece jogar parte das suas fichas no incremento e na antecipação dos programas de transferência de renda. Por outro lado, pesará a mão no debate das pautas de costumes, tema que parece ainda render, mesmo quatro anos após usar essa tática nas eleições de 2018.
Lula tentará compor com Ciro e Tebet, para isso adicionará ao seu programa propostas dos candidatos e caminhará cada vez mais para o centro. O petista tem boa vantagem, e vai pisar em ovos para não dar munição ao adversário. Bolsonaro por sua vez, deverá aumentar os ataques ao ex-presidente, deixando questões programáticas para o quinto plano.
Por fim, é certo que ganhando ou perdendo, o bolsonarismo, e a direita mais extremada que acabou por engolir parte tradicional da centro direita, continuará viva e forte nos próximos quatro anos. Este fenômeno não é brasileiro. É só lembrarmos de que, nas eleições dos Estados Unidos, Trump perdeu com 47% dos votos. Na França, Le Pen amealhou 41,5% dos votos e Kast, no Chile, obteve 44% de votos. O fenômeno é global e demandará novas estratégias tanto da esquerda, mas também da centro-direita que perdeu muito espaço com o estiramento do espectro político à direita no Brasil.
Créditos da imagem: Ricardo Stuckert e Evaristo Sa/ AFP
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