João Paulo Viana e Gabriel Ximenes da Rocha Souza
No período posterior à redemocratização, o então recém-fundado estado de Rondônia apresentou algumas das maiores taxas nacionais de migração partidária nas disputas para a assembleia legislativa e câmara dos deputados. A título de exemplo, vale citar a bancada federal rondoniense eleita para a câmara baixa na legislatura de 1991 a 1995, na qual a totalidade dos parlamentares federais vitoriosos na eleição de 1990 mudou de legenda, com alguns representantes rondonienses entre os deputados que mais migraram de partido na mesma legislatura. Decerto, as altas taxas de mudanças partidárias registradas no subsistema partidário rondoniense no período que se segue à sua fundação na eleição de 1982 até o decorrer da década de 1990, incidiram diretamente sobre o formato do incipiente quadro partidário estadual, retratado naquele período como instável, volátil e altamente fragmentado.
Embora se trate de níveis diferentes de disputas, o dado atual de migração partidária na Câmara Municipal de Porto Velho durante o período da janela partidária, iniciada em 07 de março e finalizada em 05 de abril, chama a atenção. De um total de 21 representantes na casa legislativa municipal, 17 mudaram de partido, o que representa uma taxa superior a 80% de mudança de legenda entre os vereadores da capital rondoniense. De fato, a lembrança do período inicial da competição eleitoral no estado é algo inevitável. No presente artigo, buscaremos compreender as principais causas que, supostamente, influenciaram um número tão elevado de migração partidária na atual legislatura da CMPV.
Como explicitado em recente análise de conjuntura, publicada em agosto de 2023 pelo Laboratório de Estudos Geopolíticos da Amazônia Legal (LEGAL), que serviu de base ao artigo publicado em fevereiro último em nossa coluna do Legis-Ativo aqui no Congresso em Foco, a inexistência de oposição ao prefeito Hildon Chaves (PSDB) na CMPV sinalizava para possíveis mudanças partidárias, porém, nada que vislumbrasse um patamar superior a 80%. Não obstante, o destino partidário da maioria dos vereadores já era esperado: PSDB, União Brasil e Republicanos. Essas duas últimas, legendas dominadas pelo grupo político do chefe do Executivo municipal. Inclusive, o próprio mandatário do Prédio do Relógio, sede da prefeitura de Porto Velho, possui um histórico de recente mudança partidária que vale a pena ressaltar.
Em 1° de novembro de 2022, logo após o término do segundo turno das eleições, o então tucano Hildon Chaves trocou o PSDB pelo União Brasil. Na ocasião, a solenidade de filiação contou com a participação do governador Marcos Rocha, a deputada estadual Ieda Chaves, primeira dama da capital, ambos do União, além do presidente nacional da legenda à época, Luciano Bivar, que visitava Porto Velho apenas para avalizar a filiação de Chaves ao novo partido. Ator importante e decisivo na campanha de reeleição do governador Marcos Rocha (União), Hildon Chaves se posicionava naquele momento como o possível candidato do grupo governista à sucessão do atual governador em 2026. Contudo, alguns meses depois, Chaves retornou ao PSDB, mesmo sem um rompimento com o grupo de Rocha. Nossa hipótese é de que o prefeito de Porto Velho pode ter percebido que não havia garantia de sua candidatura ao governo. Assim, diante da possibilidade de ficar de fora da disputa de 2026 pelo União, a melhor estratégia seria voltar às fileiras do PSDB e retomar o controle do partido, do qual é atualmente o presidente regional.
Em meio a essa conjuntura, diante de uma ampla coalizão política que sai vitoriosa das urnas ao governo estadual em 2022, embora sem a certeza de encabeçar a candidatura do grupo governista ao Executivo estadual em 2026, a vitória de um aliado na sucessão à prefeitura de Porto Velho tornou-se de fundamental importância aos planos políticos futuros do tucano Hildon Chaves. Desse modo, o principal nome do prefeito para a disputa, a ex-deputada federal Mariana Carvalho, ex-tucana, que até o início desse mês presidia no estado o Republicanos, agora, segundo a imprensa local, recém-filiada ao União Brasil desde a noite do dia 06 de abril, no apagar das luzes da janela partidária, desponta como favorita ao Executivo municipal. Mariana (União) é irmã do deputado federal Maurício Carvalho, um dos principais quadros do União Brasil no estado, e ex-vice prefeito de Porto Velho, eleito, ainda pelo PSDB, na chapa de Hildon Chaves em 2020.
Nesse contexto, frente à inexistência de uma oposição parlamentar à sua gestão e dono de uma supermaioria legislativa na CMPV, após o período da janela partidária o atual prefeito e seu grupo político chegam ainda mais fortalecidos para a disputa local. Como explicitado anteriormente, dos 21 vereadores, 17 mudaram de partido, o que representa uma taxa superior a 80% de migração partidária. As legendas dominadas diretamente pelo grupo político de Chaves que, ao que tudo indica, formarão a coligação majoritária da candidatura de Mariana Carvalho (União), até então totalizavam juntas apenas quatro vereadores na casa de leis da capital (PSDB 1; União 1; e Republicanos 2). Ainda que o prefeito já possuísse o controle majoritário da CMPV, com taxas de aprovação legislativas em torno de 90%, e quase a totalidade do apoio dos 21 vereadores, a partir de agora os partidos sob seu domínio direto somam 14 cadeiras (PSDB 5; União 5; e Republicanos 4), quase 70% do total de assentos da CMPV. Esse dado demonstra, com absoluta evidência, a força exercida pelo Executivo municipal sobre o parlamento local e a consolidação da base parlamentar de Hildon Chaves (PSDB).
Por outro lado, diferentemente do que ocorria nas disputas em níveis estadual e federal nas décadas de 1980 e 1990, a elevada migração partidária na CMPV, com taxa superior a 80%, diminuiu drasticamente a fragmentação partidária. Em números absolutos, as 14 legendas com assentos na CMPV na atual legislatura, foram reduzidas a apenas sete. Se o objetivo principal dos vereadores ao mudarem de partidos, é a maximização das oportunidades eleitorais, buscando novas estratégias para aumentar suas chances de reeleição, é possível também que as novas regras eleitorais, especificamente, o fim das coligações proporcionais e a própria cláusula de barreira (embora esta não entre em vigor na eleição municipal), estejam exercendo um papel fundamental no cálculo político dos representantes. Esse tema, porém, será abordado aqui em breve, numa outra oportunidade.
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