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O moralismo do recesso parlamentar informal: O que os olhos não veem, a República sente


Graziella Testa




Há muito tempo que o recesso parlamentar informal em período eleitoral é questionado e criticado no Brasil. Ocorre que de quatro em quatro anos o período que sucede o recesso de julho e que antecede as eleições tende a ser uma época atribulada na seara partidária e eleitoral e os assuntos legislativos inclinam-se a ficar em segundo plano. Desse modo, quando há atividade nesse período ela encaminha-se a ocorrer em uma ou duas semanas esparsas de esforço concentrado. Para o eleitor, esse comportamento pode parecer preguiçoso e desleixado por parte dos representantes e o ideal seria que os trabalhos não parassem durante o período eleitoral. Cabe lembrar de que os parlamentares que se ausentam de sessões convocadas de arenas que integram (Plenário e comissões) sofrem penalidades em forma de desconto salarial. Para que se faça tal redução, é preciso que haja sessão e a convocação de sessão está nas mãos do Presidente da Mesa (ele mesmo, Arthur Lira).



Aqui é preciso fazer um adendo importante: quando o assunto é política, cada vez mais fica claro que o maior inimigo da moralidade é o moralismo. Desde a fundação do que entendemos por Estado moderno Maquiavel já declarava que o bom governante é aquele que está disposto a renunciar à vida eterna em prol do seu povo. Max Weber, ao falar do lugar ético da política ressaltava que o político é aquele que sabe alternar convicção e responsabilidade. A figura do parlamentar no imaginário popular tende a ser uma mistura de Odorico Paraguaçu e Macunaíma, que não exerce suas funções por preguiça e emprega recursos de forma patrimonialista para se manter no cargo. No entanto, mais importante que exigir trabalho parlamentar em período eleitoral é refletir sobre o tipo de legislação que queremos ver aprovada no Legislativo.



O processo decisório precisa envolver informações técnicas bem construídas, participação dos membros e entidades diretamente atingidas pelas mudanças em debate, alertas dos operadores do Direito e órgãos do Executivo responsáveis pela implementação da política pública em questão. O processo de organização de preferências que abarca todos esses atores pode ser mais lento do que gostaríamos, mas o risco de cortar caminho é produzir políticas mal ajambradas, de grande visibilidade e pouco resultado e mais dispendiosas do que seria necessário. Outro resultado comum de um processo açodado – para usar o termo da moda – são as famosas leis “que não pegam”. Cheias de boa vontade e sem aplicabilidade possível, como por exemplo o crescimento do hall dos crimes hediondos sem o respectivo aumento de investimento no sistema carcerário para comportar o aumento da população carcerária.



A implicação desse moralismo associado à centralização indesejável do processo decisório na atual Legislatura é a apreciação remota de proposições relevantes e de alto impacto na vida dos indivíduos num período eleitoral em que os parlamentares estão claramente dedicados a outros tipos de atividades. Ora, se os parlamentares e todo o ecossistema político – jornalistas, assessores, consultorias etc. – estão com os olhos nas eleições, qual será a qualidade das decisões nesse período? Se teve uma lição valiosa ensinada pelo deputado e candidato a reeleição, Tiririca, é que pior do que está fica. Ah, fica sim.



Créditos da imagem: Câmara dos Deputados

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