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O troca-troca do Senado e a nova política

Humberto Dantas



Quando voltarem do recesso, os senadores brasileiros estarão completando mais um ano de mandato. Um terço deles sete anos, e dois terços deles três. Olhar para os 27 parlamentares que terão que colocar suas cadeiras em jogo nas eleições de 2022 e lembrar o que ocorreu em 2018 pode apontar mudanças extremas. Na última eleição, dos 54 senadores que colocaram suas vagas em disputa, apenas 32 tentaram se manter no cargo e menos de dez conseguiram. Trata-se de eleição majoritária árdua em instante de resistência à política, mesmo que se diga que as radicalidades já atingiram seu ápice, e agora talvez venha um período mais calmo.



Efervescências à parte, quero olhar aqui para esses 54 senadores que foram eleitos, por assim dizer, no contrapé da política tradicional. Ou na ressaca dos velhos nomes ou hábitos. Será? Digo isso com base nos números apresentados acima. Busco compreender em que medida tais atores se mantiveram fiéis a novas e velhas práticas. Uma delas, muito criticada, é a mudança excessiva de partido político. Por mais que as pessoas em geral menosprezem as legendas, desde que se entendeu que mandato majoritário pertence ao eleito, a festa não perdeu o ritmo e manteve-se em alta o tal troca-troca – que obviamente cada político consegue justificar com base em mil teorias, desculpas e interpretações da realidade.



O primeiro dado que chama a atenção está associado a uma mera curiosidade: interessante que alguns partidos passaram a controlar todas as três cadeiras de um mesmo estado no Senado Federal. São os casos do PL no Rio de Janeiro, que também tem o governador do estado e o presidente da República. Na casa alta do Legislativo: Romário em término de mandato se bandeou do PSB para o Podemos e em seguida para os liberais; Carlos Portinho, suplente do falecido Arolde de Oliveira, deixou o PSD e; Flávio Bolsonaro saiu do PSL, foi atabalhoadamente para o Patriota e desembarcou com o pai no PL. O Paraná, por sua vez, virou reduto do Podemos a partir do trio formado por Álvaro Dias – que eleito pelo PSDB em 2014 passou pelo PV -, Flávio Arns, que foi eleito pelo PSL e Oriovisto Guimarães, já escolhido pela legenda. Seria a onda Sérgio Moro, que já havia sido escalado ministro em 2018, durante a presidencial campanha, pelo próprio Dias? Provável, sobretudo porque no estado o ex-juiz é visto por parcelas do eleitorado como a esperança com semblante de entidade. Por fim, em Minas Gerais, até meados de dezembro todos estavam no PSD, que governa a capital Belo Horizonte com Alexandre Kalil, eleito pelo PHS e que levou com ele, na mudança, o senador Carlos Viana – que acaba de migrar para o MDB e se lançar ao governo estadual. O presidente Rodrigo Pacheco deixou o DEM, e Antônio Anastasia, que já governou o estado, saiu do PSDB depois de anos e estava no PSD. Agora, escolhido para o TCU, em seu lugar deve assumir o primeiro suplente Alexandre Silveira que, curiosamente, em 2014, foi eleito em sua chapa pelo PSD.



Entre os 54 “novatos” que completam os três primeiros anos do atual mandato no Senado, 19 titulares já mudaram de partido – mais de um terço (35%). Outros cinco eleitos, quase 10%, já deixaram o mandato – some os percentuais e terás quase metade dos recém-eleitos. Dois deles faleceram de Covid, com discursos contrários à prevenção – Arolde no Rio de Janeiro e Olímpio em São Paulo. Ambos foram substituídos por agentes que já trocaram de partido. Uma política mato-grossense, Selma, foi cassada por corrupção eleitoral, a despeito de ter carregado a fama de ser, no Judiciário, “um Moro de saias”. E dois se licenciaram – Confúcio Moura em Rondônia, por razões particulares – e o ministro bolsonarista Ciro Nogueira, do PP, que deixou a vaga para a esposa, sua primeira suplente na chapa.



Em alguns estados, a dupla eleita em 2018 já mudou integralmente de partido. São os casos do Acre, Espírito Santo, Goiás, Minas Gerais e Rio Grande do Norte. O Senado é, estadualmente, o mesmo que venceu na urna, em termos de nome e partido, em Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Roraima, Pernambuco, Pará, Maranhão, Bahia, Amazonas e Alagoas, ou seja, em apenas um terço das unidades federativas. Se desconsiderarmos saídas, cassações e falecimentos, essa lista poderia ter, em suplentes ou substitutos eleitos que se mantiveram nas legendas, os casos de Rondônia, Piauí e Mato Grosso.



E não se engane quem acha que isso foi uma arrumação inicial. Até o comecinho de abril temos o prazo de filiação partidária para quem vai disputar votos em 2022 – em 2024 eleições municipais, e em 2026 o pleito onde tais atores podem buscar a reeleição. Para a disputa de outubro, os 54 nomes poderiam pensar que possuem mais quatro tranquilos anos de mandato, mas aí está o ponto central. Somando todos os 81 parlamentares, o Senado se caracteriza por ser um laboratório de candidaturas, uma incubadora de sonhos. Num rápido olhar temos Rodrigo Pacheco, Simone Tebet e Alessandro Vieira na busca pela presidência da República, Jorginho Mello ou Espiridião Amin mirando o governo de Santa Catarina, Heinze no Rio Grande do Sul, Carlos Viana em Minas Gerais, Styvenson no Rio Grande do Norte, Rodrigo Cunha em Alagoas, Arns no Paraná, Jaques Wagner na Bahia, Reguffe no Distrito Federal, Weverton e Roberto Rocha no Maranhã etc. Todos pelos mesmos partidos que estão hoje?



Por fim, atenção igualmente absoluta à tal fusão entre PSL e DEM, que deve criar o União Brasil. Atualmente são cinco senadores eleitos em 2018 – a despeito do trio que já deixou o PSL (2) ou foi cassado (uma) – e três que vêm da eleição de 2014. Como fica a vida local desses políticos? Existe convivência pacífica entre o DEM dos senadores de 2018 em Rondônia, Roraima e Mato Grosso e o PSL nesses locais? E entre o PSL do Mato Grosso do Sul e do Acre, e o DEM estadual? E o trio de parlamentares do DEM eleito em 2014 no Ceará, Amapá e Sergipe? Como se dão com o PSL? Percebe? Novas mudanças poderão ocorrer, elas dão a exata dimensão de como renovar nomes não altera velhas práticas, e como partido ainda nos parece, apenas, o traje da moda para o desfile político-eleitoral. Até quando?

Créditos da imagem: Pedro França/Agência Senado

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