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Os efeitos do fim das coligações proporcionais e da nova regra para disputa de sobras na eleição

João Paulo Viana e Márcio Carlomagno



O fim das coligações partidárias em eleições proporcionais foi a principal mudança no sistema eleitoral brasileiro para a eleição municipal de 2020. A medida concedeu à disputa um caráter de laboratório para os pleitos seguintes, em especial, a eleição geral de 2022, quando a nova regra estreará nas eleições para a Câmara dos Deputados e Assembleias Legislativas. Observado, quase que unanimemente, por estudiosos como um fator de enfraquecimento da vida partidária brasileira, na prática, o mecanismo funcionava como um único partido, deturpando o voto na legenda, e contribuindo para que, especialmente, os menores partidos burlassem o quociente eleitoral e alcançassem representação nas casas legislativas.



Nesse sentido, ao instituir o fim das coligações proporcionais, a reforma eleitoral de 2017 (lei nº 13.488/2017) possuía um duplo objetivo. Inicialmente, visava dar maior clareza aos eleitores sobre sua escolha eleitoral, no que, independentemente dos resultados do segundo objetivo, já foi bem-sucedida. Ao passo que ainda possuía como meta produzir um efeito redutor do número de partidos efetivos no Brasil, considerado tanto por especialistas, quanto pelo mundo político, demasiado alto. Os resultados a seguir comparam o número de partidos efetivos nos municípios brasileiros, entre 2016 e 2020, e demonstram que este segundo ponto também foi alcançado. Os dados são expressos de duas formas, em um histograma, e com intervalos categorizados, de mais fácil compreensão.






Em 57,7% dos municípios brasileiros, ocorreu diminuição de um ou mais partidos efetivos. Se incluirmos na conta a redução que ficou abaixo 1 (entre 0,01 e 0,99), poderíamos dizer que ocorreu diminuição em 76,4% dos municípios brasileiros. Em apenas cerca de 7% o número efetivo de partidos subiu acima de 1. Esta redução, contudo, não é linear para todos municípios. Os dados mostram que ela tem mais efeito nos municípios de magnitude pequena (nove cadeiras), ou média (10 a 19 cadeiras), e não é tão efetivo nos distritos com 20 ou mais cadeiras. Estes dados referem-se a 5.447 municípios cujos dados se encontravam disponíveis no repositório do TSE no dia 28/11/2020. Os valores das 121 cidades restantes, contudo, não devem alterar substancialmente as tendências demonstradas.



A segunda alteração legislativa sobre a fórmula eleitoral da divisão de cadeiras, promovida em 2017, foi a permissão para partidos que não atingiram o quociente eleitoral disputarem as chamadas “sobras eleitorais”. Na distribuição de cadeiras, geralmente, após a primeira rodada, calculada a partir do quociente eleitoral, ainda restam vagas a serem preenchidas. Até 2018, apenas partidos que obtiveram cadeiras na primeira rodada participavam das rodadas seguintes. A partir desse ano, todos partidos poderiam participar. Essa mudança foi promovida por um temor de ordem lógica: caso a regra fosse mantida, e houvesse cenários em que apenas um partido tivesse forças eleitorais para superar o quociente eleitoral, só ele poderia disputar as sobras e, como consequência, ganharia todas as cadeiras da Casa.


Ocorre que essa nova regra talvez pudesse funcionar como um contrapeso ao fim das coligações, em termos de reduzir o número efetivo de partidos. A questão aqui colocada é: será que essa regra afetou substancialmente o número de partidos que conseguiu obter cadeiras? Há muitas formas de explorar a resposta ao questionamento acima. Uma delas é a comparação, dentro de cada casa legislativa, entre o número de partidos nominais que obteve cadeiras e o número de partidos que conseguiu ultrapassar o quociente, indicando, assim, o número de partidos beneficiados em cada município. Por exemplo, no município de São Paulo, 17 partidos conseguiram obter cadeiras, sendo que 15 deles conseguiu ultrapassar o quociente eleitoral. Portanto, dois partidos foram beneficiados pela nova regra.





Conforme o gráfico mostra, em mais de 3 mil municípios a nova regra não incluiu nenhum novo partido. Ou seja, todos partidos com representação também ultrapassaram o quociente. Em outros 1290 a nova regra incluiu apenas um partido a mais. Em menos de 150 municípios a nova regra teve efeito de incluiu 5 ou mais partidos.



Estes resultados são positivos pois sugerem que, em geral, mesmo correndo isoladamente, os partidos possuem musculatura suficiente para disputar eleições proporcionais e atingir o quociente eleitoral. É indicativo, portanto, que futuras mudanças no regramento legal poderá endurecer esta regra, se quiser eliminar os casos de partidos beneficiados por isso.



Não obstante, além dos objetivos alcançados, ou seja, a redução da fragmentação e uma representação mais justa, tornando mais inteligível aos cidadãos o quadro da competição partidária, a medida exerceu forte influência também sobre a eleição majoritária. Com o fim da coligação, na luta pela sobrevivência eleitoral, as legendas lançaram um maior número de candidaturas nas disputas às prefeituras. Nesse caso, a estratégia foi assegurar maior visibilidade, com o objetivo de estimular a lista de candidatos ao cargo de vereador, tendo em vista a impossibilidade de efetuar coligações no plano proporcional. Assim, em boa parte dos municípios brasileiros, de forma inédita, a eleição majoritária obteve um número recorde de postulantes. A esse tema em especial, retornaremos numa próxima oportunidade.

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