Dolores Silva
Não é novidade a descrença a respeito da adesão da classe política a um difuso projeto para a sustentabilidade da Amazônia. A vulnerabilidade socioeconômica da grande maioria da população e o cenário de destruição ambiental, configurado a mais de meio século, impõem ceticismo a qualquer mensagem salvacionista vinda da classe política da região ou alhures. Mas, diante da emergência climática que assusta a todos atualmente, deve-se questionar a respeito da atuação das lideranças regionais, especialmente os deputados estaduais e federais que assumiram seus mandatos eleitorais em 2023.
O papel proativo de Helder Barbalho (MDB), do governo do Pará durante o governo Bolsonaro, se destacou ao enfrentar as indisfarçadas ações de incentivo ao desmatamento e à exploração dos recursos naturais da região. Observando a ampla coalizão eleitoral pela qual o governador se reelegeu em 2022 - MDB, Federação PSDB-Cidadania, Federação Brasil Esperança (PT, PCdoB, PV), PP, PSD, PDT, REPUBLICANOS, AVANTE, PODEMOS, UNIÃO, DC, PTB e PSB –, seu apoio eleitoral de mais de 70% de votos e seu apoio partidário na ALEPA, é fácil adivinhar que a aprovação de uma agenda ambiental no Legislativo estadual não enfrentará grandes turbulências. O partido do governador cresceu 30% na atual legislatura, com a obtenção de 13 cadeiras.
No que toca à representação parlamentar, contudo, não vemos se destacar a ação de parlamentares paraenses tratando da pauta ambiental no âmbito da Assembleia Legislativa ou da Câmara dos Deputados. Também não foi perceptível a relevância dessa pauta no fortalecimento das candidaturas na última campanha eleitoral.
O estado do Pará elege 41 deputados estaduais e 17 deputados federais. Das proposições dos deputados estaduais voltadas para o meio ambiente predominam matérias simbólicas que homenageiam datas, eventos e instituições. Das oito Leis sancionadas no período 2019-2022, disponíveis no site da ALEPA, cinco determinam a utilidade pública de instituições, destacando-se três propostas substantivas de autoria do Executivo.
A Lei nº 9.048/2020, de autoria do Executivo, foi aprovada em cooperação que pareceria constrangedora a quem não acompanha o processo decisório nos Legislativos estaduais. Os presidentes das principais comissões da Assembleia, CCJ (MDB) e CFFO (PDT), se autodesignaram relatores da proposta que deu origem a Política Estadual sobre Mudanças Climáticas no Pará (PEMC/PA) e aprovaram em um dia a proposta do governador.
A Comissão de Ecologia, Meio Ambiente, Geologia, Mineração e Energia, então presidida pelo MDB e que deveria analisar o mérito da proposta, nem se deu ao trabalho de emitir relatório, o projeto foi simplesmente aprovado. A CEMAGE tem a atribuição de analisar temáticas que acionam um alerta para o observador mais cético, pois juntar os interesses da exploração mineral com ecologia resulta em uma mistura pouco palatável para os ambientalistas.
A aprovação desse projeto do Executivo demonstra que a agenda ambiental do governador tem propriedades para ser deglutida por parlamentares que não se destacam pela bandeira do ambientalismo. A ênfase de Helder Barbalho na promoção da bioeconomia dá visibilidade aos benefícios da política pública e pode incluir populações tradicionais, através de apoio a atividades econômicas baseadas em produtos da floresta, que acenem com a bandeira da sustentabilidade. Mas, para essa pauta ter efeitos positivos é necessário, também controles e fiscalização rigorosos.
A promessa de ganhos com o mercado de carbono destaca a via mais palatável da pauta ambiental, atraente a um ambientalismo empresarial. Isso facilita a cooperação dos parlamentares na ALEPA, muitos dos quais são aliados da mineração e da monocultura.
A pauta do governador afirma, também, o compromisso com a regulação ambiental e com o rigor na fiscalização. O fato de cerca de 70% das terras públicas no PA serem de domínio da União favorece seu discurso de compromisso com a preservação, Helder festeja eficiência na proteção das terras estaduais. Mas não há como seu papel de liderança regional ficar totalmente blindado de cobranças quando uma grande catástrofe ambiental ocorre na Amazônia, como no caso de grandes queimadas e do avanço sobre territórios de populações tradicionais e de áreas ambientais legalmente protegidas.
Olhando para a arena nacional, o MDB elegeu 9 deputados federais, a maior bancada do estado, seguido de PL (3), PSD (3), PT (2) e do UNIÃO BRASIL (1). O maior número desses parlamentares está nas comissões de Minas e Energia (CME) e da Amazônia e dos Povos Originários e Tradicionais (CAPOT), com 6 e 5 deputados, respectivamente. Apenas José Priante (MDB) foi para a Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável. A presença nas comissões sinaliza interesse em temáticas como energia, mineração e populações tradicionais, que são centrais nas tragédias que tem como cenário a Amazônia. Mas não assegura que a atuação dos parlamentares será direcionada e efetiva na proteção ambiental em suas dimensões sociais e ecológicas.
Chama atenção nessas comissões a presença de deputados aliados ao bolsonarismo, patrocinadores do negacionismo e da exploração econômica predatória na região. Joaquim Passarinho (PL), Delegado Caveira (PL) e Celso Sabino (UB) não são presenças auspiciosas para o ambientalismo. O último participa da CME e da CAPOT - ou CPOVOS, conforme registrado em projetos de lei - que foi desmembrada da Comissão de Integração Nacional e Desenvolvimento Regional no início da atual legislatura.
Na Câmara dos Deputados a atuação parlamentar se efetiva em múltiplas arenas e está atrelada ao peso e aos compromissos partidários. Vale apostar na atuação da minoria de esquerda, aliados da pauta ambiental. Contudo, observando o perfil dos deputados estaduais e federais paraenses não se destaca nenhuma atuação parlamentar que se diferencie por uma bandeira fortemente atrelada à defesa do meio ambiente e de direitos para os povos tradicionais. Resta-nos, à frente dessa agenda, o destaque para a atuação do governador que de forma inteligente procura comunicar a pauta ambiental e assegurar o apoio de gregos e troianos.
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