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Precisamos legitimar ainda mais o eleito no dia 30: votemos!

Humberto Dantas



Em 2018, o Brasil tinha 147 milhões de eleitores. Compareceram às urnas no segundo turno, 116 milhões de pessoas, ou 79% do total. Algo pouco menor que os 117 milhões da primeira rodada daquele ano, quando cerca de 80% dos brasileiros votaram. O que esperar de 2022? No primeiro turno tivemos aumento muito discreto do percentual de ausências em relação ao pleito presidencial anterior, com 156 milhões de aptos e 124 milhões de presenças (21%).



A partir de então, algumas considerações precisam ser feitas, pois tivemos mudanças recentes na realidade das eleições. A primeira delas está associada ao nível de polarização e intensidade das campanhas. Lula e Bolsonaro somaram mais de 92% dos votos válidos em primeiro turno, algo inédito e superior aos 90% de 2006, quando vivíamos a artificial verticalização do TSE que empurrou para fora do pleito presidencial seis dos dez maiores partidos do país.



Ademais, as pesquisas de segundo turno mostram que Lula e Bolsonaro estão quase empatados, com vantagem discreta para o ex-presidente, e espelhamento nas rejeições aferidas pelos principais institutos a ambos. Ou seja, não é só uma questão de votar em um dos dois, mas também de não votar de maneira alguma no adversário, o que pode aguçar a presença dos cidadãos. Em 2014, no dia anterior ao segundo turno, por exemplo, o Datafolha mostrava Dilma com 52% dos votos e Aécio com 48%, o que se repetiu rigorosamente nos resultados. Mas o mineiro tinha “apenas” 42% de rejeição e a então presidente 38%, ou seja: havia lógica polarizada, mas em cenário menos intenso. E aqui está o primeiro desafio dessa eleição: o que os derrotados farão e como se comportarão? Lembrando que reconhecer a derrota é pressuposto utilizado por pensadores políticos como característica central das democracias representativas, com a necessária legitimação dos perdedores às regras e procedimentos.



Mas temos elementos adicionais. O semblante denso dessas eleições teria sido capaz de reduzir o total de votos inválidos? Explico: em 2018 tivemos cerca de 9% de votos brancos e nulos no primeiro turno presidencial, e este percentual caiu pela metade em 2022. Por quê? Voto mais aguerrido e “fácil” de ser ofertado ou simplesmente o cidadão entendeu, em intensidade maior entre aqueles que invalidariam seus votos, que utilizar um aplicativo da Justiça Eleitoral para justificar ausência seria melhor? Completa a força desse cenário hipotético o fato de que as filas de votação em algumas cidades desestimularam parcelas das pessoas. Assim, se tal argumento estiver certo, podemos ter sentido inverso no esperado aumento de abstenções entre turnos, ou seja, uma eleição extremada como a atual pode levar mais o eleitor à urna – o que torcemos que aconteça. E podemos garantir: com apenas um ou dois votos, considerando aqui os 12 estados em que a eleição para governador está aberta, as filas tendem a ser menores.



Em resumo: podemos esperar maior comparecimento? Torcemos que sim, e por isso, inclusive, o estímulo às catracas livres nos transportes públicos etc. Positivamente, o Datafolha da semana passada mostrou que o apoio do brasileiro à democracia, seja lá o que entendamos por ela, bateu recordes. Se em meados dos anos 90 andava na casa dos 42% de adesão à sentença “a democracia é sempre melhor”, em 2022 atingiu 79%, com a ideia de que “em certas circunstâncias uma ditadura é melhor” atingindo seu pior resultado em mais de 30 anos, com 5%. Diante de tal resultado, e enfatizando o desafio que temos para validar e consolidar o que coletivamente entendemos por democracia, se existe algo que nosso modelo representativo deseja é: que o eleitor expresse o efetivo desejo das maiorias. Isso justificaria, inclusive, a ideia de que o voto é obrigatório.



Sem qualquer contestação legal, mas apenas com base em uma argumentação de ordem moral, devemos entender que nunca um presidente brasileiro foi eleito com mais da metade do eleitorado o apoiando, o que não o deslegitima. Veja só: os 58 milhões de votos de Bolsonaro no segundo turno em 2018 equivaliam a 39% dos eleitores totais, enquanto em 2014 a então presidente Dilma seria reconduzida ao Planalto com 38%, pouco menos que os 41% de 2010. Lula foi quem chegou mais perto na história: 46% em 2006 e 2002, com as vitórias em primeira rodada de Fernando Henrique Cardoso em 1994 e 1998 na casa dos 36%, e Collor em 43% em 1989. O distanciamento do eleitor em relação à política faz com que esse debate já comece em cerca de 20% de ausências, o que faz as pesquisas terem dificuldades de entender o impacto das ausências no resultado. Note: os estudos hoje apontam que Lula e Bolsonaro somam mais de 90% das intenções votos, mas quais eleitores converterão desejo em voto? Esse é o ponto.



E nesse instante é digno e necessário dizer: o brasileiro e a brasileira precisam votar, para que o resultado das urnas se aproxime do que existe de mais legítimo, representativo e digno. Isso não é um questionamento às urnas eletrônicas, pelo contrário, tampouco à justiça eleitoral, mas uma forma de tentarmos sair menos fustigados de uma eleição extremada. Se conseguirmos reduzir as abstenções e garantirmos que votos inválidos ficarão em percentuais baixos, a exemplo do primeiro turno, seria possível sonhar com um eleito mais perto de um amplo desejo da sociedade, e contra quem qualquer tentativa insana de questionamento se aloque, aos olhos do país, em gesto tresloucado e criminoso.

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