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Quem apoiaria o golpe?


Eduardo Seino


Diante de mais uma ofensiva do presidente contra as urnas eletrônicas, as reações ao discurso golpista se adensam. Para esclarecer, entendemos como golpe qualquer interrupção no processo eleitoral regular deste ano ou posterior interferência na posse e efetivo mandato dos eleitos. Normalmente, a pergunta seria se vai ter golpe, mas talvez seja mais interessante nos questionarmos quem apoiaria algo desse tipo.

É quase um exercício inevitável voltarmos às condições do golpe militar de 1964, pontuando alguns fatores e contextos, ainda que brevemente. Em primeiro lugar, não existe uma crença generalizada, inclusive entre o oficialato, de uma ameaça comunista interna ou externa, tampouco um clamor pela entrada dos militares como moderadores de uma situação política de risco ou desordem.



Para todos os efeitos, a tomada de decisões não está paralisada e não temos um clima de caos administrativo, a despeito da generalizada falta de planejamento no governo federal. Na ausência propositiva do Executivo, a Câmara dos Deputados e o Senado Federal tornaram-se protagonistas no direcionamento dos recursos públicos. Além disso, muitos parlamentares opõem-se aos ataques do presidente à urna eletrônica, incluindo o presidente do Senado.



No âmbito internacional, não existe um ator político externo relevante que apoie o bolsonarismo e seus delírios. A apresentação recente a embaixadores de diversos países[1] não causou outro efeito senão nos envergonhar mais uma vez diante do mundo. Por sua vez, internamente, a crise econômica e a má avaliação do atual governo dificultam a construção de um apoio amplo para a sua continuidade e, ao contrário da vontade do presidente, a sociedade brasileira demonstra confiança nas urnas eletrônicas[2], mesmo diante de sucessivos ataques.



Para fechar a conta, restaria saber com maior precisão o que pensam os integrantes do Alto Comando das forças armadas e qual o nível de influência que os militares afeitos ao bolsonarismo conseguiriam dentro destas instituições ao insistirem no discurso da manipulação das eleições. Assim, é pouco crível a entrada de um ator político decisivo em apoio à ruptura institucional democrática. No entanto, vale ressaltar: embora as condições estruturais e conjunturais sejam desfavoráveis ao golpe, isto não significa dizer que não haverá uma tentativa de levá-lo adiante.



As narrativas golpistas estão montadas e seguem sendo repetidas. O discurso que tenta descredibilizar a urna eletrônica é o pretexto escolhido para tensionar a relação entre uma ala dos militares ligada a Bolsonaro e o Judiciário, neste caso representado pelo Tribunal Superior Eleitoral – TSE. Ao insistir na necessidade de algum tipo de verificação extra dos resultados das urnas, estes atores políticos tentam criar um clima de desconfiança e conspiração, com base na retórica da fraude eleitoral.



No Legislativo, a corrida eleitoral direciona a atenção dos parlamentares para a conquista dos votos e, somado a isso, a liberação escandalosa das emendas do orçamento secreto fideliza momentaneamente um grupo de apoio ao presidente. Aliás, há que se questionar quantos destes não adorariam a permanência a qualquer custo de um presidente que não governa e entrega tudo aos seus no parlamento.

Os grupos sociais favoráveis ao presidente são, sempre que possível, excitados ao confronto ou a tomar medidas pelas próprias mãos. O assassinato recente de um militante petista por um militante bolsonarista dá o alerta do que está por vir. Nesse sentido, causa calafrios pensar se alguns setores das forças de segurança subnacionais ou mesmo civis armados não terão algum nível de mobilização, caso os resultados eleitorais não favoreçam às suas convicções.



O que está acontecendo é grave. Mesmo que preservada a institucionalidade democrática, está desenhado um cenário de conflito social com a insistência e a radicalização da narrativa da fraude eleitoral. Por isso, afirmar reiteradamente o respeito aos resultados das urnas eletrônicas precisa estar na ordem do dia, tanto das instituições quanto dos cidadãos, até que ocorram as posses dos eleitos.




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