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As MPs do primeiro ano de governo do presidente Jair Bolsonaro: descaso e inabilidade política?

Joyce Luz e Luiz Alberto Gomes


O presidente Jair Bolsonaro (atualmente sem filiação partidária) já deixou claro muitas vezes sua impaciência e falta de habilidade em fazer política. Com um discurso e ações que misturam o descrédito ao funcionamento de governos de coalizões, o embate com possíveis aliados e a inaptidão para a realização de acordos, que o jogo político exige, o atual chefe do Executivo brasileiro vai perdendo chances de implementar de forma mais assertiva uma agenda de políticas do governo. A diferença aqui é que se antes essa impaciência e falta de experiência política eram visíveis somente no plano dos debates e discursos noticiados pela mídia, a análise das Medidas Provisórias (MPs) apresentadas pelo atual presidente em seu primeiro ano de governo transforma a ausência de uma agenda de políticas em uma realidade com dados concretos e expostos para aqueles que quiserem conferir.


Fechado o primeiro ano de seu mandato, Bolsonaro é o presidente, desde a redemocratização em 1988, com menor número de MPs sancionadas no primeiro ano de gestão. Foram apenas 11 medidas analisadas e aprovadas no Congresso Nacional entre as 48 editadas (14 acabaram rejeitadas ou expiraram, e outras 21 seguiram em tramitação até o fim de 2019). O gráfico abaixo apresenta os mesmos dados, ou seja, as MPs aprovadas e rejeitadas nos 12 primeiros meses de todos os presidentes brasileiros desde 1988 até 2019. Destaca-se ainda aqui: entre todos os presidentes brasileiros, Jair Bolsonaro é o que mais teve MPs não aprovadas em seu primeiro ano de governo.


Fonte: Banco de Dados do Legislativo do Cebrap


De todas as MPs sem validade, 9 caíram ainda durante a etapa preliminar de análise pelo Legislativo, ou seja, na comissão mista ou na Câmara, etapas que geralmente são as duas primeiras para a sanção. Já das 12 aprovadas, apenas duas não foram transformadas em PLVs (Projeto de Lei de Conversão), ou seja, não tiveram o texto enviado pelo governo alterado por congressistas. Outras 16 MPs viraram o ano ainda na comissão mista, boa parte delas com o debate ainda no início. Mas afinal de contas, o que esses dados nos dizem?


Estes números são resultados diretos da política, ou melhor, da não política presidente. Principal força legislativa do governo, já que o texto assinado pelo presidente e o ministro da área possui força de lei, as Medidas Provisórias poderiam ser uma ferramenta importante para o novo governo implementar uma agenda de políticas, tal como foi para todos os outros presidentes. No caso do atual presidente ainda há um agravante, já que ele escolheu governar sem partidos, sem um governo de coalizão, e se quer tem uma sigla própria. Assim, as MPs poderiam ser uma ferramenta que poderia ajudar “driblar” algumas resistências no Congresso.


Porém, sem a vontade política de Bolsonaro e sem experiência para realizar as negociações que todo e qualquer sistema político exigem, as MPs da sua gestão têm sido deixadas de lado pelo Congresso ou estão sendo tocadas por parlamentares que concordam com o projeto, mas não se sentem obrigados a pensarem nas preferências do governo. Sem esforço e sem a governabilidade necessária, o presidente tem entregue a agenda da sua gestão para a Câmara e o Senado, o que tem reforçado o poder de lideranças das Casas, como Rodrigo Maia (DEM-RJ) e Davi Alcolumbre (DEM-AP).


Ao abrir mão de governar para o Legislativo, a decisão do presidente representa uma incoerência nunca vista no Planalto, que sempre optou por controlar a agenda de discussão das duas Casas, uma vez que possui mais poderes. E pior, ao não trabalhar pelo avanço das suas MPs, Bolsonaro torna pouco produtivo o gasto de energia de membros do governo para implantar políticas públicas e ajuda a causar insegurança jurídica, já que as novas regras criadas podem perder validade no período de 120 dias úteis.


Talvez o maior exemplo desse gasto de tempo e pouca inteligência seja a MP da carteirinha estudantil digital. Lançada com o intuito de facilitar a vida dos estudantes e diminuir fraudes em documentos de meia entrada, segundo o governo, a iniciativa do MEC (Ministério da Educação) perdeu validade no meio de fevereiro. Com isso, o projeto que custou R$ 5 milhões e contou com publicidade de R$ 2,5 milhões, de acordo com informações da LAI (Lei de Acesso à Informação) obtidas pelo jornal Folha de S.Paulo, não tem mais funcionalidade. A medida sequer saiu da fase de debate da comissão mista do Congresso.


A falta de articulação política do Presidente é vista também em outras MPs que não deveriam ser de difícil aprovação, mas que perderam eficácia em 2019: como auxílio emergencial para vítimas da queda da barragem da Vale em Brumadinho (MG); contrato temporário de pessoal para o Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional); e organização de órgãos de infraestrutura de transportes.


Embora a falta de interesse de Bolsonaro em criar uma governabilidade tenha um impacto claro na agenda do Executivo, como podemos notar pelo balanço de MPs no primeiro ano do governo, nada parece apontar para uma mudança de rumo. O presidente segue em 2020 mais empenhado em ataques gratuitos, falar de temas pouco relevantes e defender sua família. Enquanto isso, lideranças partidárias e do Congresso aproveitam o vácuo de poder para ter uma independência e uma agenda própria inédita desde a redemocratização.


Palavras-chave: Movimento Voto Consciente; Poder Legislativo; Poder Executivo; Bolsonaro; MP; Medidas Provisórias.

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