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Eleições para a Mesa Diretora da Câmara dos Deputados e impeachment: será que dá samba?


Joyce Luz



Aumento no número de casos de pessoas contaminadas com a covid-19; aprovação das vacinas de Oxford e da CoronaVac; falta de oxigênio nos hospitais de Manaus e pessoas morrendo sem ar; erros, falhas e atraso nas negociações para a compra das vacinas de Oxford com o laboratório de produção localizado na Índia; desvio de doses de vacinas que deveriam ir para profissionais da saúde e demais grupos prioritários; possível falta de insumos e atraso do governo nas negociações para a compra; etc. Pois é, caros leitores, não está fácil ser brasileiro. Eu poderia continuar aqui listando e narrando os inúmeros acontecimentos e fatos políticos que marcaram a última – e somente a última – semana no Brasil, mas é preciso escolher, dentre tantos, um assunto para tratar com vocês.



E eu escolho falar de um acontecimento que não pode passar despercebido dos nossos olhos: as eleições para a presidência da Câmara dos Deputados, marcada para acontecer na próxima segunda-feira, 1º de fevereiro. Lideram a disputam ao cargo o deputado Baleia Rossi (MDB-SP) e o deputado Arthur Lira (PP-AL). Mas afinal, qual é a importância de assumir tal cargo? O que está em jogo com essas eleições para a presidência da Câmara dos Deputados?



Para responder a essas questões é preciso antes, aqui, esclarecer qual é o papel e as responsabilidades atribuídas ao Presidente da Câmara dos Deputados. Vamos então começar pelo mais simples. O Presidente da Câmara dos Deputados é quem, primeiramente, ocupa a cadeira principal da Mesa Diretora – órgão responsável por organizar e decidir toda a agenda de trabalhos no interior do Legislativo. De acordo com o artigo 17 do Regimento Interno[1] da Câmara dos Deputados, cabe ao Presidente da Câmara as principais (mas nem todas elencadas aqui) atribuições:



1. Controlar a ordem e o tempo de fala do pronunciamento dos deputados;

2. Organizar e definir, ouvido as lideranças partidárias, toda agenda e a ordem de apreciação das proposições legislativas tanto dos membros do Legislativo, quanto do Executivo;

3. Proceder à distribuição de matéria às Comissões Permanentes ou Especiais, bem como deferir pela retirada de uma proposição da agenda do dia;

4. organizar e presidir todas as votações;

5. Analisar e decidir sobre a abertura ou não dos processos de investigação contra o Presidente da República;



Colocadas aqui tais atribuições, responder ao que está em jogo nas eleições da próxima segunda-feira deixa de ser algo tão simples ou trivial. A disputa em torno do cargo da Presidência da Câmara envolve ter em mãos o tão famoso – e pouco entendido – Poder de Agenda, ou seja, envolve ter o poder não só de organizar todos os trabalhos no interior do Legislativo, como também ter o poder de controlar e definir o que, quando e como uma proposição, um projeto de lei, poderá ser apreciado. E ter esse poder, caros leitores, não é pouco. É muito.



Dou aqui um exemplo: se na data de hoje os 513 deputados federais, bem como o Presidente da República decidissem, cada um, apresentar 01 projeto de lei, teríamos ao todo 514 projetos para serem analisados. Se ousássemos ainda mais e multiplicássemos essa conta pela quantidade de dias em um ano, chegaríamos a um total de 187.610 projetos. Um número impossível de ser apreciado pelo Legislativo. E é aqui que o papel do Presidente da Câmara começa a se tornar importante. É o Presidente dessa casa, junto com as principais lideranças partidárias, quem deve escolher quais projetos de lei, dentre todos que são apresentados, terão prioridade para serem apreciados.



E como se não bastasse tamanho poder, não podemos esquecer do item 5 colocado acima. Cabe ao Presidente da Câmara analisar e decidir sobre a abertura ou não dos processos de investigação contra o Presidente da República. E novamente convido os leitores a fazerem uma reflexão aqui. Imaginem-se no papel de um Presidente da República que deseja ter a aprovação da população. Para que isso aconteça é importante que o Presidente consiga aprovar no interior do Legislativo suas promessas de campanha, agora transformadas em políticas.



Lembrando do poder que o Presidente da Câmara tem de decidir e definir quais e quando os projetos de lei serão apreciados, parece inteligente e racional que o Presidente da República tenha boas relações com o Presidente da Câmara dos Deputados. Essa boa relação torna-se ainda mais importante se o Presidente da República possui baixa aprovação popular e motivos que dão margem (lembremos aqui dos últimos fatos e acontecimentos caóticos do Brasil na última semana) para que o Presidente da Câmara decida por aceitar ou abrir um processo de investigação – processo de impeachment – contra o Presidente da República.



E juntando nessa história toda a candidatura do deputado Baleia Rossi (MDB-SP) à presidência da Câmara dos Deputados, lembrando aqui que este representa a sucessão e a continuidade dos trabalhos do atual presidente da Câmara Rodrigo Maia (DEM-RJ), com a candidatura do deputado Arthur Lira (PP-AL), candidato apoiado pelo atual Presidente da República Jair Bolsonaro (sem partido), qual samba será que vamos ouvir ao final? Os enredos não apresentam letras tão fáceis: ou continuamos com um Legislativo que se recusa a aceitar que a omissão de ajuda com envios de cilindros de oxigênio também configura crime de falta de responsabilidade com seres humanos ou aceitamos de vez que pessoas podem morrer sem ar nesse país.

Pois é, caros leitores, não está fácil ser brasileiro.

[1] https://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/legislacao/regimento-interno-da-camara-dos-deputados/arquivos-1/RICD%20atualizado%20ate%20RCD%2012-2019%20A.pdf

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